14 de fevereiro de 2011

Bonito de doer



 (...) Me veio um fundo desprezo pela minha/nossa dor mediana, pela minha/nossa rejeição amorosa desempenhando papéis tipo sou-forte-seguro-essa-sou-mais-eu. Que imensa miséria o grande amor - depois do não, depois do fim - reduzir-se a duas ou três frases frias ou sarcásticas. Num bar qualquer, numa esquina da vida. Ai que dor: que dor sentida e portuguesa de Fernando Pessoa - muito mais sábio -, que nunca caiu nessas ciladas. Pois como já dizia Drummond, "o amor car(o,a) colega, esse não consola nunca de núncaras". E apesar de tudo eu penso sim, eu digo sim, eu quero Sins."

Caio F. in Pequenas Epifanias


porque amou por que amou
se sabia
p r o i b i d o p a s s e a r s e n t i m e n t o s
ternos ou desesperados
nesse museu do pardo indiferente
me diga: mas por que
amar sofrer talvez como se morre
de varíola voluntária vágula evidente?

ah PORQUE AMOU
e se queimou
todo por dentro por fora nos cantos ecos
lúgubres de você mesm(o,a)
irm(ã,o) retrato espetáculo por que amou?

se era para
ou era por
como se entretanto todavia
toda via mas toda vida
é indignação do achado e aguda espotejação
da carne do conhecimento, ora veja

permita cavalheir(o,a)
amig(o,a) me releve
este malestar
cantarino escarninho piedoso
este querer consolar sem muita convicção
o que é inconsolável de ofício
a morte é esconsolável consolatrix consoadíssima
a vida também
tudo também
mas o amor car(o,a) colega este não consola nunca de nuncarás.

A cada vez que me deparo com algum trecho do Caio F., que hoje se encontram aos montes nos blogs, tumbrls, fico me perguntando como esse cara conseguia escrever com essa acuidade, com essa apropriação da dor que ele parecia carregar em cada célula do corpo, em cada partícula da alma. Ele extraía beleza e poesia de situações banais e cotidianas, que com suas palavras deixavam de ser simples acontecimentos diários, e viravam eventos cheios de carga emocional. É muito bom ver essa memória ser preservada, as palavras que ele nos deixou serem difundidas e espalhadas na net, mesmo que seja uma "modinha", o importante é que muitas pessoas tenham a oportunidade de conhecê-lo e adorar tudo o que ele escreveu.
Como eu.

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