10 de setembro de 2009

Tudo bem também.



"O coração, se pudesse pensar, pararia.
Considero a vida uma estalagem onde tenho que me demorar até que chegue a diligência do abismo. Não sei onde me levará, porque não sei nada. Poderia considerar esta estalagem uma prisão, porque estou compelido a aguardar nela; poderia considerá-la um lugar de sociáveis, porque aqui me encontro com outros. Não sou, porém, nem impaciente nem comum. Deixo ao que são os que se fecham no quarto, deitados moles na cama onde esperam sem sono; deixo ao que fazem os que conversam nas salas, de onde as músicas e as vozes chegam cómodas até mim. Sento-me à porta e embebo meus olhos e ouvidos nas cores e nos sons da paisagem, e canto lento, para mim só, vagos cantos que componho enquanto espero.
Para todos nós descerá a noite e chegará a diligência. Gozo a brisa que me dão e a alma que me deram para gozá-la, e não interrogo mais nem procuro. Se o que deixar escrito no livro dos viajantes puder, relido um dia por outros, entretê-los também na passagem, será bem. Se não o lerem, nem se entretiverem, será bem também".
(Bernardo Soares)

A leitura pra mim é tudo. Dela tiro o pão nosso. É o que gosto de fazer nas minhas horas livres. A partir dela, dou forma a sorrisos e reflexões. Deito lágrimas ou as seco. Viajo e saio do meu lugar comum.
E de tudo o que leio, sempre me volto à algumas leituras, que, mais acuradamente, ajudam-me a me desvendar para mim mesma. 
É da poesia especialmente que estou falando. A poesia tem canal direto com a minha alma. Muitas vezes, é através dela que me permito viver grande parte de meus sentimentos que ficam, por contigência ou necessidade, guardados, bem guardados.
Apesar dos meu quereres pelo Leminski, meu respeito pelo Bandeira, a ternura que tenho pelo Quintana, a admiração pelo Drummond, só para citar alguns os quais  visito mais frequentemente, o Fernando Pessoa é o meu eleito: ele me decifra e não é raro, a cada leitura que faço, me descobrir  e me reinventar em suas palavras.
Se de logo, sua poesia sempre me afetou muito, no finalzinho do ano passado comprei o Livro do desassossego. Que foi pra mim um achado. Hoje ele é meu livro de cabeceiras e de consulta. Quase um oráculo rsrsrs.
Coloquei um excerto, esse, não o retrato do que estou vivendo, mas a representação da vontade do que eu queria estar sentindo agora.
Deixar um pouco minhas tantas e tão frequentes questões. Deixar um pouco as vestes do que sou e esperar. Se acontecer,bem, se não acontecer, tudo bem também. Afinal, esta estalagem é passageira e a diligência vai chegar para todos nós....

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